“RP é muito mais do que organizar uma conferência de Imprensa”
A guerra entre publicidade e relações públicas está a ser ganha pela publicidade. Quem o diz é Al Ries, o guru das relações públicas. Saiba ainda o que Laura Ries, a outra cara-metade da consultora Ries&Ries, tem a dizer sobre brand building e gestão de crise
Foi considerado pela revista PR Week uma das 100 pessoas mais influentes no século XX. Obras como Positioning: The Batlle for your Mind ou A Queda da Publicidade e a Ascensão das Relações Públicas ajudam a explicar porquê.
Há uma guerra entre a publicidade e as relações públicas pelo controlo das mentes dos decisores? Quem está a ganhar?
Al Ries (AR): Neste momento o mundo da publicidade está a ganhar a guerra. Tem sido uma luta de há longos anos sobre quem controla ou quem deve ser a fonte principal, sobretudo, para o lançamento de novas marcas ou produtos. Odeio dizer isto, mas penso que o pessoal da publicidade não irá abandonar o controlo desta disciplina. Até um certo ponto, algumas pessoas do mundo das relações públicas (RP) não querem necessariamente ser responsáveis pelo desenvolvimento de uma estratégia para o lançamento de uma marca. Gostam da ideia de deixar o pessoal da publicidade fazer isso e em serem apenas os seus “ajudantes”. Ou seja, limitam-se a juntar-se ao grupo e a fazer uns quantos press releases sobre a campanha de publicidade. Comunicar a publicidade é uma função e não há nada de errado nela, mas penso que os RP deviam, em primeiro lugar, ter um maior controlo sobre o processo de lançamento de novas ideias e marcas. RP é muito mais do que organizar uma conferência de Imprensa e emitir um press release. Devemos esquecer as ferramentas tradicionais de RP e focarmo-nos naquilo que o cliente deve fazer que justifique uma história. Garanto-lhe que se a Guatemala (o país) mudar de nome, obtém publicidade em todo o mundo. Eles avançaram com uma nova campanha de publicidade - “Sol da Terra” - e não tiveram notícias em nenhuma publicação, em lugar algum do mundo.
Os RP são, então, os seus piores inimigos?
AR: Os RP precisam de um pouco mais de auto-confiança na sua disciplina. Por qualquer razão, alguns RP não vêem o sucesso das RP, tendem a olhar para o sucesso da publicidade. Por exemplo, no início, a Starbucks tinha muitas RP mas as vendas não reflectiam isso. Depois arrancaram, a marca começou a fazer publicidade e o pessoal da publicidade disse “fomos nós. Nós provocamos este efeito nas vendas”. As RP têm um efeito a posteriori. O que fazemos hoje em RP pode só ser visível daqui a alguns anos. Portanto, é muito difícil medir o seu sucesso.
Mas no que toca a medições, no seu livro A Queda… apresenta inúmeros exemplos de campanhas publicitárias com boa criatividade, com elevados níveis de notoriedade e que não tiveram reflexo nas vendas do produto…
AR: O que as agências de publicidade fazem, e que penso que é magnífico, é: dizem que chegaram a 15 milhões de pessoas, numa média de cinco vezes este mês, o que é 250 milhões de contactos. O cliente responde que não vendeu nada. E a agência diz que não é da sua responsabilidade, que o produto é que não é bom, mas que eles fizeram o seu trabalho. Eles não vendem “vendas”, vendem contactos.
Não é suposto influenciarem as vendas?
AR: Claro. Mas isso é a sua desculpa. Dizem nós temos os contactos, mas ao que parece as pessoas não queriam comprar o produto, portanto, alguma coisa deve estar errada com o produto ou com o serviço.
Laura Ries (LR): Para fazer um bom serviço de relações públicas precisamos de uma ideia, podemos fazer publicidade sobre qualquer coisa. É muito mais difícil fazer RP.
AR: É esse o desafio das RP. É preciso ter uma boa ideia para comunicar uma acção. Ou temos de fazer qualquer coisa louca como fazem o Richard Branson ou o Donald Trump. Penso que é uma profissão muito mais exigente do que a publicidade. Na publicidade chega-se ao pé do cliente e perguntamos-lhe o que ele quer dizer no anúncio. O cliente diz que quer que as pessoas pensem que somos confiáveis, muito baratos e que toda a gente gosta de nós. O publicitário pega nisso, tira uma fotografia do produto, e faz um anúncio. Enquanto que, se o pessoal das RP reunir com o cliente e se não conseguir obter nada que seja válido em termos de notícia não consegue fazer nada. Podemos sempre fazer publicidade, mas nem sempre podemos fazer RP com a mensagem que se coloca na publicidade. Por isso, de longe, as RP são uma disciplina mais difícil.
É por isso que quando ponderam investir em publicidade ou RP, os decisores optam invariavelmente por publicidade. Pelo menos é esta a situação em Portugal.
AR: É também a situação em muitos países. No Brasil, por exemplo, as pessoas da publicidade têm imensa força. Eles ditam tudo e têm controlo total, muito mais até do que nos Estados Unidos. É incrível como as empresas brasileiras dependem tanto das suas agências de publicidade. A nossa mensagem nunca colheria no Brasil onde a publicidade é extremamente forte.
Em Portugal o investimento em publicidade não tem crescido nos últimos anos. Considera que esta é a oportunidade ideal para as RP se imporem?
AR: Penso que é uma óptima oportunidade para as RP. Aliás, há óptimas oportunidades para as RP. Por exemplo, a questão dos nomes das marcas. A razão pela qual há tantas extensões de marca, é que o pessoal da publicidade faz investigação e diz que as pessoas lêem um anúncio se lá tiver um nome que reconheçam e não o farão se o nome não lhes dizer nada. Por isso, temos que ir na onda da extensão de marca, o que é bom para a publicidade. Em RP, se tivermos um novo nome como Lexus é muito mais fácil conseguir uma boa cobertura, porque soa a algo novo e diferente. Portanto, muito do que faz sentido em RP não o faz em publicidade. O que nós dizemos é: façam primeiro a RP e, quando a marca está estabelecida, apostem em publicidade. Foi exactamente desta forma que o Ipod foi introduzido nos Estados Unidos. Não fizeram qualquer publicidade nos primeiros anos.
Não será essa a excepção que prova a regra? Ou seja, as marcas investem primeiro em publicidade e, só mais tarde, em RP.
LR: É por isso que muitas grandes empresas não estão a lançar nenhuma nova marca bem sucedida. As marcas bem sucedidas a nível global estão a ser lançadas por pequenas empresas que normalmente não têm dinheiro para publicidade e, por isso, fazem RP e, consequentemente, constroem marcas poderosas. As grandes companhias dos Estados Unidos não têm sido bem sucedidas nesse processo. Veja-se o caso da Coca-Cola que tentou introduzir novas categorias e falhou totalmente com Mr. Pep e Powerade, entre outras. Produtos que falharam porque não foram os primeiros na sua categoria e usaram massivamente a publicidade e não RP. O melhor que a indústria de RP pode fazer é tentar chamar a atenção e obter o reconhecimento para o facto de todas as novas grandes marcas - as Starbuck’s as E-bay e afins - não terem sido lançadas com publicidade.
AR: Outra questão é que, em termos genéricos, as pessoas que trabalham em RP não estudaram marketing. Muitos deles são antigos jornalistas, o que é bom, mas faz com que não se sintam muito confortáveis a desenvolver estratégias de marketing e que tendam a pensar que essa é a força da publicidade. O que dizemos aos RP é que têm de estudar marketing, têm de analisar o que funciona ou não, antes de avançar para uma campanha de RP.
LR: Muitas vezes nem são convidados para a reunião de desenvolvimento de estratégia, só são chamados quando tudo já está finalizado. Isso está a mudar nos Estados Unidos á medida que as RP estão a ser cada vez mais proeminentes e as empresas estão á procura de alternativas á publicidade. As RP estão a ganhar terreno porque são tremendamente eficazes, particularmente, para a construção da marca, dada a sua credibilidade, em oposição á publicidade que simplesmente não tem credibilidade porque é a voz da empresa. Temos de ter uma entidade terceira que sirva de endorsement que é o que as RP oferecem. Basicamente, é como fomentar word-of-mouth. É isso que constrói as marcas e as RP são a melhor forma de promover esse efeito.
RP é também considerada a melhor forma de gerir crises. O caso Taco Bell…
LR: Com a E-colli e os ratos…Temos de combater os problema com as ferramentas mais adequadas. Se temos um problema de RP não podemos combatê-lo com publicidade. É por isso que ter um CEO bem conhecido como porta-voz da empresa é extremamente importante, porque ele tem essa ligação com os consumidores. É reconhecido e digno de confiança e, portanto, quando diz que estão a lidar com a situação, as pessoas sentem-se mais confortadas. A Taco Bell não fez nada disso. Limitou-se a publicar alguns anúncios a dizer que a sua comida era segura, o que só faz com que as pessoas pensem que estão a esconder qualquer coisa.
Muitas companhias optaram por esta via porque quando a crise se instala querem fazer qualquer coisa rapidamente e publicar um anúncio dá aos membros da administração a sensação de que estão a fazer algo. Um exemplo de uma boa estratégia foi a adoptada pela HP quando confrontada um escândalo na administração. Foram muito proactivos em fazer RP, em colocar os líderes da empresa nos media.
O caso da Taco Bell foi amplificado pelos novos media, no caso a internet…
LR: Nada é pior do que uma imagem de rato… Somos uma sociedade visual e, com o advento da televisão e da internet, este tipo de imagens espalham-se como fogo.
O que é que uma empresa de RP pode fazer perante este cenário?
LR: O CEO precisa de estar lá a liderar a conversa. Não podemos só ter um RP ou um press release. Não vai funcionar. Marcas poderosas precisam de CEO igualmente poderosos e conhecidos do público. Um CEO que investe tempo em RP, na construção da marca, e que está disponível durante uma crise da marca para ser a voz da marca.
Este caso coloca um desafio também ás empresas de RP. Com as novas tecnologias, com um blog, rapidamente se pode destruir uma reputação que levou muito tempo a construir.
LR: É preciso ter uma relação com o consumidor que não seja somente baseada em publicidade, mas sim em confiança e RP. E, novamente, reforço a ideia da necessidade da marca ter um CEO reconhecido pelo público. Muitas pessoas consideram que isso é um risco, pois o CEO pode sempre envolver-se em algum escândalo. É um risco que se tem de assumir e, no fim, penso que é compensador. Não se pode sobreviver sem colocar a marca na mente dos consumidores e, se algo acontece, não se sobrevive a não ser que se tenha esse CEO que possa lidar com a situação e usar as RP e os media para chegar aos consumidores. As pessoas adoram odiar uma empresa se esta fizer qualquer coisa de errado, mas são muito relutantes em odiar uma pessoa.
AR: Quem é que consegue odiar o Al Gore? Podemos ser um republicano ou contra as suas ideias sobre o aquecimento global, mas ninguém consegue odiar um indivíduo assim. Se um indivíduo transmite, sobretudo em televisão, a ideia de que é alguém preocupado, que quer fazer a coisa certa é muito difícil odiá-lo, mesmo que discordemos do que ele diz.
A longo prazo, considera que as RP irão ganhar a guerra?
AR: Penso que sim, mas penso que vai demorar um pouco. Nada muda de forma muita rápida, sobretudo, alterações de tipo organizacional. Há 30 anos não havia um director de marketing. Havia um director comercial e outro de publicidade. Hoje temos directores de marketing mas isso não aconteceu da noite para o dia, levou três ou quatro décadas. Portanto, vai levar décadas para que esta questão de RP vs publicidade seja resolvida.
(fonte: Meios & Publicidade)
segunda-feira, 12 de maio de 2008
Posted by ...
Unknown
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12:18
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entrevista
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