O sr. foi a primeira pessoa a utilizar metáforas sobre o contágio de enfermidades para se referir à divulgação em massa de idéias e produtos. Que caminho percorreu?
Fui jornalista especializado em ciências no Washington Post durante muitos anos
Nessa época, escrevi vários artigos sobre o tema. Descobri que os epidemiologistas têm uma forma muito particular de entender a propagação de certas enfermidades e que seu enfoque poderia ser aplicado a outros campos, muito além do âmbito da medicina.
Os três princípios com que esses médicos lidam servem para descrever a rápida difusão de idéias, a aceitação generalizada de um produto e qualquer fenómeno social que adquira proporções desmedidas. Os princípios são simples: os vírus têm capacidade de contágio, pequenas causas provocam grandes efeitos e, a partir de um momento-chave, uma enfermidade já não se propaga passo a passo, mas com grande rapidez.
Então, que qualidades deve ter uma idéia de negócios ou um produto para fazer esse “contágio” em grande escala?
A capacidade de contágio depende da situação ou do que interessa às pessoas em determinado momento. Em geral, descobre-se a resposta a essa pergunta estudando o público-alvo ao qual o produto é dirigido.
Por exemplo, o que explica a capacidade de contágio do iPod (o reprodutor de MP3 da Apple) é a simplicidade. As pessoas estavam fartas de dispositivos eletrónicos cada vez mais complexos. Ansiavam por algo simples e o iPod satisfez essa exigência.
Contudo, 20 anos antes, a simplicidade não teria sido contagiosa porque os consumidores procuravam produtos com mais funcionalidades. Portanto, não existem regras fixas, elas variam de acordo com o momento e o contexto.
O sr. poderia ilustrar os outros dois princípios, o de que as pequenas causas produzem grandes efeitos e o do momento-chave?
É fácil entendê-los no episódio da queda do muro de Berlim. Se nos tivessem
perguntado, antes de 1989, o que poderia provocar a reunificação da Alemanha, quase todos teríamos dito que seria um processo diplomático longo e complicado ou milhões de dólares em ajuda económica.
Contudo, as causas da queda do muro foram vários pequenos protestos na Alemanha Oriental realizados em setembro de 1989. Por alguma razão incompreensível, a polícia não os reprimiu. E eles foram crescendo nos meses seguintes até que, em 9 de novembro de 1989, milhares de pessoas se juntaram em Berlim e derrubaram o muro.
No seu livro, salienta o “poder do contexto” como um dos factores que influem na origem e na propagação dos fenómenos epidémicos. O que é isso?
A idéia básica é que o comportamento humano sofre muita influência das características do ambiente. Recordemos a “teoria da janela partida”, dos especialistas em criminologia George Kelling e James Wilson. Essa teoria postula que, se alguém atira uma pedra contra uma janela e ninguém se encarrega de repôr os vidros partidos, as pessoas deduzirão que o assunto não tem importância. Ao fim de algum tempo, inevitavelmente, haverá mais janelas com os vidros partidos e o prédio transmitirá uma sensação de desleixo a toda a comunidade, permitindo o “vale-tudo”. Ou seja, a criminalidade é um fenómeno contagioso, cuja propagação pode começar no contexto de uma simples janela partida. Porém, se o contexto for mudado, a reversão torna-se possível.
Pode dar um exemplo de uma empresa que modificou o contexto a seu favor e de como o fez?
O exemplo que me vem à mente agora é de uma empresa que fez isso para o público interno. Ela aplicou a chamada “regra dos 150”, segundo a qual o comportamento dos grupos humanos muda quando são compostos por mais de 150 membros; a camaradagem e a coesão, em particular, diminuem sensivelmente. A norte-americana Gore, fabricante do tecido resistente à água Gore-Tex, decidiu que nenhuma de suas unidades poderia ter mais de 150 funcionários. Assim, conseguiu que o índice de rotatividade de pessoal ficasse um terço abaixo da média do seu sector e, além disso, converteu-se numa empresa que, segundo as pesquisas, encontra-se entre as melhores para trabalhar, obtendo resultados positivos durante os últimos 35 anos. Ela adequou o contexto.
Os adeptos do chamado “marketing epidêmico” atribuem importância decisiva à comunicação “boca-a-boca”. O que as empresas devem fazer para desencadeá-la?
É preciso, antes de tudo, reconhecer a importância de dois tipos de indivíduos: os “conectores” e os “mavens”. A palavra “maven” provém do iídiche e significa “o que acumula conhecimentos”. Utilizo-a para me referir aos peritos em informação, pessoas com tendência a recolher dados e a compartilhá-los.
Os conectores, por sua vez, caracterizam-se por conhecer muitíssimas pessoas dos mais diversos ambientes, adoram criar relacionamentos.
Numa empresa, os funcionários com essas características exercem uma função importante na comunicação interna e na resolução de problemas; por sua vez, os clientes com habilidades conectoras ou de mavens tornam-se cruciais para desencadear o fenómeno boca-a-boca.
Quais são as chaves para identificá-los?
Os mavens não são meros colectores de informação. Possuem informações sobre muitos produtos, preços e lugares diferentes, gostam de mergulhar em discussões com colegas e dissipar dúvidas. Constituem uma espécie de banco de dados; eles processam as informações e, assim, as facilitam. O que distingue os mavens particularmente é sua disposição de contar o que sabem a todo mundo.
Já os conectores são aqueles que divulgam a informação.
Como se escolhem os clientes que actuarão como conectores e mavens na difusão de um produto ou serviço?
As empresas devem analisar detalhadamente as diferenças em sua carteira de clientes.
Os mavens, por exemplo, são quase sempre os primeiros a comprar um produto. Por esse motivo, as empresas de software os atraem com versões beta dos seus programas. Fornecem os produtos para que eles os testem antes de lançá-los no mercado.
Como são curiosos por natureza, os mavens aceitam a proposta e estudam o software em busca de erros e de possíveis falhas. Esse processo, denominado beta-testing, contribui para o desenvolvimento do produto e serve para eliminar atritos na relação com os grupos de utilizadores especialistas que, em geral, são muito requisitados por clientes menos familiarizados com a tecnologia.
Os conectores costumam ocupar um lugar de destaque na sociedade. Para promover os seus produtos, por exemplo, os laboratórios farmacêuticos poderiam identificar os médicos que têm muitos contactos, que estabelecem ligações sociais com seus colegas e que participam em congressos de medicina, entre outras actividades.
Algumas empresas nos Estados Unidos já oferecem análises de redes, isto é, estudam ambientes específicos para detectar quem ocupa papéis centrais na difusão de idéias ou produtos.
No seu livro "Releasing the ideiavirus", Seth Godin diz que “o mito do
momento-chave é perigoso, pois induz quem tem uma idéia para um negócio a pensar que basta esperar o suficiente para que algo aconteça naturalmente e a idéia se propague”. Na realidade, Godin afirma que o cuidado e a alimentação de uma idéia-vírus é um processo que requer muito esforço. Qual é sua opinião?
Concordo com grande parte do que diz Godin. Não quero propagar a fé ingénua de que uma mudança de grandes proporções está logo ali ao dobrar a esquina. O que sugiro é que há momentos nos quais é possível dar um grande salto, se modificarmos o contexto e aproveitarmos, de maneira inteligente, as capacidades naturais de indivíduos com boas relações sociais e dispostos a divulgar nossas propostas.
quinta-feira, 3 de janeiro de 2008
Posted by ...
Unknown
às
11:58
Categories:
Labels:
entrevista
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário