Com o capitalismo de consumo, não são unicamente os objectos comerciais que se multiplicam e difundem no corpo social, é uma nova cultura, de novos referenciais, que se apodera da quotidianidade. Uma cultura que exalta continuamente os prazeres do bem-estar e dos lazeres, da moda e do "entertainement": Já não se trata dos ideais sacrificiais, mas da fruição de sensações, do corpo, de férias.
Toda uma cultura hedonista edifica-se, afixando os sonhos de felicidade privada sob o signo do "fun", da ligeireza, do erotismo, do humor. Às ideias de renúncia sucedeu uma cultura de desculpabilização, de tentação, de estimulação permanente de desejos. Os ideais heróicos do futuro, típicos da primeira modernidade, deram lugar a uma cultura imediatista de satisfação dos desejos, continuamente renovados.
Cultura de consumo hiperbólico que se impõe igualmente como uma cultura de marcas. os logótipos afixam-se em todo o lugar e em todos os suportes; aparecem, com o desenvolvimento do "product placement", em filmes e em séries de televisão. os seus nomes brilham em todas as grandes avenidas das cidades, nos museus patrocinados, nas lojas de "duty-free" de todos os aeroportos do mundo, nos sites e nas ligações da internet. A Europa conta com mais boutiques de luxo do que com livrarias. O que é que escapa ainda à maré das marcas? Óculos, relógios, marroquinaria, jóias, material de escritório, equipamentos de desporto, produtos alimentares, telefones, mobiliário de design, tudo entra, agora, no reino das marcas, sejam elas nacionais ou internacionais.
A realidade das marcas mundiais não é certamente nova: aparecem a partir do primeiro momento da sociedade de consumo, no fim do século XIX e no início do século XX. Mas o fenómeno conheceu uma amplificação considerável no decorrer das últimas décadas do século anterior, com a internacionalização crescente das empresas. Implantadas nos cinco continentes, abrangendo todos os sectores, as marcas multiplicam-se e gozam de uma notoriedade internacional crescente devido aos orçamentos faraónicos de marketing.
Algumas delas, desconhecidas há 10 ou 20 anos, tornaram-se estrelas mundiais (google, apple, ...). No momento da cultura planetária, publicam-se regularmente a classificação do valor das 100 maiores marcas mundiais, largamente dominadas, de resto, pelos Estados Unidos da América. A cultura-mundo é a do triunfo das "global brands" e dos seus logótipos universalmente conhecidos.
Marcas que trabalham continuamente para construir a sua imagem e a sua legitimidade, para desenvolver a sua notoriedade e a sua promoção. Às marcas de um único produto, sucedem-se as políticas de extensão de marcas, por vezes, em todos os sentidos: A Virgin é uma editora de música, uma cadeia de lojas multimédia, uma marca de vodka, uma companhia aérea low-cost, um operador de telemóveis; A Armani coloca o seu nome nos hotéis, a Porsche nos relógios, isqueiros, óculos, canetas.
A força das marcas revela, por outro lado, o desenvolvimento sem precedentes da contrafacção, agora de amplitude planetária.
Quando o mundo se entretece de logótipos e se encontra inundado por imagens comerciais, mais marcas aparecem como os novos grandes fetiches da cultura-mundo.
O que o comprador deseja presentemente é menos um produto do que uma marca com o seu estilo, o seu prestígio, o seu imaginário, a sua força de sonho. Um novo fascínio pelas marcas desdobra-se e já não está circunscrito às elites sociais do ocidente, mas abrange todas as nações, todos os extractos da população, todas as idades.
Mesmo quando se observa hoje um reforço da "sensibilidade ao preço" e um certo desinteresse em relação às marcas este último fenómeno continuar a ser relativo e de geometria variável, os consumidores combinam cada vez mais compras de marcas com compras de não-marcas. Agora, mesmo os mais desfavorecidos conhecem e desejam procurar as mais belas marcas.
E enquanto os jovens sonham menos com a moda do que com marcas, Vêem-se alguns pais americanos que vão até dar um nome de marca (Chanel, Armani, Porsche, L'Óreal) aos seus filhos!
Hoje, os jovens conhecem infinitamente melhor os nomes das marcas do que os da história, da literatura ou da religião. Marcas que são bem mais do que etiquetas de produtos de tal maneira estão no centro de inumeráveis fóruns e conversas reais ou on-line: objectos de desejo dos consumidores, as marcas são também novas peças constitutivas da cultura quotidiana em todo o globo.
Se a cultura-mundo é uma cultura de marcas, ela é também uma cultura de estrelas e, como se diz hoje em dia, de
people. Os "pipole" multiplicam-se, invadem as imagens publicitárias, as revistas, os programas de televisão. Já não há um único domínio que escape ao
star-system e à "pipolização".
As marcas apelam cada vez mais às celebridades para associá-las à sua imagem. O
people é cada vez mais necessário para as audiências, para amplificar as vendas, para fazer irradiar uma imagem de marca.
Não consumimos unicamente produtos, filmes, viagens, música, desporto, consumimos a celebridade como uma maneira de singularizar-personalizar o mundo comercial impessoal.
Starmania que não se pode separar da necessidade de evasão e de sonho, mas também de encontrar figuras conhecidas num mundo de mudança contínua e acelerada.
O hiperconsumidor deseja o novo e moda, mas ele deseja igualmente referências e pontos de ancoragem: os "pipole" têm a virtude de responder simultaneamente a esta dupla expectativa, ao combinar estas dimensões contraditórias.
Quanto menos as culturas de classe estruturam os comportamentos, menos os produtos se mostram capazes por si só de orientar o consumo; quanto menos as fronteiras, que separam a direita da esquerda, são escavadas, mais eleitores "flutuantes" votam por personalidades e não por programas.
A sociedade do "toda a gente" vem preencher o vazio que acompanha a individualização extrema das nossas sociedades e a balcanização das fronteiras colectivas, a despolitização e a dissolução das tradições de classe. As novas musas trazem do sonho e das histórias personalizadas (intrigas e outras notícias) num universo de banalização tecnológica.