O que é a teoria da Cauda Longa?
A teoria da Cauda Longa diz que a nossa cultura e economia estão a mudar do foco de um relativo pequeno número de 'hits" (produtos que vendem muito no grande mercado) no topo da curva de procura, para um grande número de nichos na cauda. Como o custo de produção e distribuição caiu, especialmente nas transações online, agora é menos necessário massificar produtos num único formato e tamanho para consumidores. Numa era sem problema de espaço nas prateleiras e sem gargalos de distribuição, produtos e serviços segmentados podem ser economicamente tão atrativos quanto os produtos de massa.
Por que as empresas aderiram com tanto entusiasmo à teoria da Cauda Longa?
Porque a teoria é verdadeira. Mas também porque ela é uma figura de linguagem que descreve um fenómeno que está à nossa volta. Todos vemos a internet, todos vemos a mudança que ela está a provocar, mas não tínhamos uma boa maneira para descrever essa mudança. Uma frase que descreve, de maneira simples, um fenómeno complexo é muito útil.
A sua teoria apregoa o crescimento dos nichos. Mais produtos, mais escolhas, para grupos menores de consumidores. Os hits estão com os dias contados?
Algumas pessoas que analisaram a teoria disseram que seria o fim dos hits, mas elas enganaram-se. O livro não diz isso. O que digo é que o monopólio dos hits está comprometido. No século XX havia os hits ou nada, no século XXI teremos os hits e os nichos. Os hits irão competir com milhares de produtos de nicho, mas sempre teremos hits. A consequência é que os mercados serão mais diversificados e cada vez menos concentrados.
Muito se comentou a respeito do filme Serpentes a Bordo como uma demonstração do poder da internet e dos mercados de nicho. Mas o filme decepcionou com uma bilheteria de US$ 15,2 milhões no primeiro fim de semana de estreia nos EUA. Talvez o nicho não seja tão poderoso e eficiente?
A teoria pressupõe o surgimento de microhits e pequenas estrelas. Eles não são blockbusters, não são os mais populares livros, filmes ou discos. A questão é: o filme decepcionou ao estrear nos Estados Unidos? Mas esse era um filme destinado a ir a lugar nenhum. Era um filme que iria directo para o DVD, tradicionalmente seria ignorado no mercado. O ponto é que ele foi melhor do que poderia ter ido de outra forma. Aplique as regras de blockbusters para todos os filmes, a maior parte vai falhar porque a maioria não é blockbuster. E o modelo antigo diz: se não é um blockbuster, um grande sucesso, falhou. No mundo do blockbuster, US$ 100 milhões é pouco, mas no nicho, US$ 10 milhões pode ser muito. No nicho não precisa gastar milhões em publicidade.
Num artigo na revista eletrónica Slate.com, Tim Wu, professor da Universidade Columbia, afirmou que a teoria da Cauda Longa não é aplicável, por exemplo, ao negócio da exploração de petróleo. As pessoas que compram gasolina não teriam a possibilidade de recorrer ao nicho, quando o monopólio prevalece nesse sector.
Na verdade, ele está errado sobre o petróleo. Mas o ponto principal dele está certo, a teoria não pode ser aplicada em todo os lugares. A teoria sobre o petróleo está errada. Os preços sobem porque as grandes companhias são ineficientes na exploração, mas estão a surgir pequenas companhias eficientes na exploração de petróleo com custos menores. Ele está certo ao dizer que a teoria não se aplica a tudo, mas eu nunca disse que ela se aplicava a tudo.
Em 2000 houve o estouro da bolha da internet. A teoria da Cauda Longa e a internet estão directamente relacionadas. Se ocorrer um novo estouro da bolha, a sua teoria não explode também?
Primeiro é preciso dizer que o estouro da bolha não foi um estouro da bolha da internet, foi um estouro da bolha de acções na bolsa de valores. A internet é definida pelo número de PCs, conexões e utilizadores, enfim, toda essa infra-estrutura. Todos esses números indicam que nada afectou a internet. Desde os anos 90que eles crescem. A avaliação que o mercado de acções fazia dessas empresas é que explodiu. Olhe o crescimento das empresas de internet e a bolha nunca existiu. Olhe para o mercado de acções e verá grandes variações.
Como explicar o caso da American On Line, que já foi uma das maiores empresas de internet e hoje está em crise?
Isso acontece, as companhias caem. A AOL era uma companhia de linhas telefónica que não esteve apta para migrar para o mercado de conexões de banda larga. E provavelmente isso acontecerá com grandes companhias actuais. Yahoo, eBay, Google, Microsoft, Oracle. Algumas dessas empresas talvez tenham problemas no futuro e não estarão aptas a continuar dominando. Uma bolha estourando significa simplesmente que a evolução continua a acontecer no mercado.
Hoje, uma das expressões que mais se discutem é a cultura wiki, colaborativa. O seu livro surgiu de um artigo que você publicou em 2004, "A Cauda Longa", na revista Wired, e desde então manteve um blog sobre o assunto. Como foi esse trabalho de colaboração?
Não escrevi o livro de maneira colaborativa, escrevi sozinho, mas a pesquisa foi feita de forma colaborativa. Quando divide os seus dados, idéias e informações, as pessoas respondem dando mais em troca. Coloca uma ideia, as pessoas ampliam e devolvem. Essa é a natureza humana, pessoas quererem colaborar e isso é muito bom. Wikipédia e muitas coisas funcionam com esse princípio. Isso aprimorou a minha análise. Novas aplicações para as ideias surgiram. Talvez tenha sido mais uma conversa do que propriamente uma colaboração, mas a escrita foi totalmente individual e off-line, da maneira antiga.
Um livro à moda antiga? Como editor da Wired, uma revista de tecnologia, as pessoas não têm uma expectativa de algo inovador e moderno?
Nunca pensei nas coisas dessa maneira. Acho que se eu escrevo um livro da velha forma também é bom. Acontece que vivo neste mundo que descrevo, faço parte da indústria do blockbuster também, estou nos grandes media. Faço parte do mainstream, trabalho para a CondéNast (editora americana que publica revistas como Vogue, New Yorker e Vanity Fair). Mas na outra parte da minha vida, sou um blogguer, estou no mercado de nicho. Mas é um mundo misturado, onde profissionais competem com amadores, os grandes meios concorrem com mercados de nicho e o novo modelo, mas acho que vivo em ambos.
Grandes companhias americanas estão a fazer uma campanha junto dos políticos e do governo para passarem a cobrar uma "portagem" na internet, onde quem pagasse mais teria privilégios na rede. O que é que acha disso?
Não gostaria de entrar nesse assunto. Acho um tema complicado e geralmente as pessoas interpretam de maneira errada comentários sobre o tema. Mas não penso que isso vá acontecer. Não acho que eles vão conseguir controlar a internet. Ela é muito distribuída, tem muitos participantes. Não estou preocupado com essa possibilidade.
As empresas de telecomunicação são inovadoras como deveriam?
Não, mas não devemos olhar para as empresas de telecomunicação esperando inovações. Elas criam algumas inovações em infra-estrutura como fibra ótica, mas são basicamente empresas de infra-estrutura, o que elas devem fazer é estar disponíveis para todos.
Blogs, Wikipédia, sites como o YouTube, onde vídeos de pessoas anónimas são predominantes. Pode-se dizer que o século XXI será a era dos amadores?
Não um século só de amadores, mas os amadores irão dividir status com os profissionais. Será de ambos. O século XX foi dos profissionais, o século XXI será o século onde amadores e profissionais competem.
É um dos conferencistas do Fórum Económico Mundial. Por que aceitou o convite?
É uma oportunidade de conversar com muitas pessoas que, de outra maneira, eu não iria encontrar, pessoas de fora do mundo que eu frequento. É uma chance para aprender sobre Médio Oriente, Ásia, Rússia, política petrolífera. Falo sobre tecnologia e pessoas podem aprender comigo, mas há outros aspectos do mundo com os quais não tenho contacto no meu dia-a-dia.
Marx descreveu uma sociedade comunista como um lugar no qual "ninguém tem uma esfera exclusiva de actividade, mas cada um pode se aperfeiçoar em cada actividade que ele deseje... caçar pela manhã, pescar à tarde, tratar do gado à noite e criticar depois do jantar". A teoria da Cauda Longa é de certa forma marxista?
Não vamos confundir. Marx foi um grande economista e estava certo em muitas coisas. Marx é lembrado pelo comunismo e a noção de que o Estado deveria controlar a economia, o que estava completamente errado. Mas como eu disse, foi um grande economista e fez observações muito perspicazes.
Não seriam a internet e o sistema colaborativo de código aberto (Open Source) um tipo de socialismo eficaz?
Não acho. No socialismo, o Estado controla, a propriedade é colectiva mas controlada por um pequeno número de burocratas. Acho que o sistema Open Source se aproxima mais da anarquia, ninguém está no controle. E os comportamentos surgem dos indivíduos, e muitas vezes contrários ao poder institucional. É totalmente contrário ao Estado e o socialismo é favorável ao Estado.
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008
Posted by ...
Unknown
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14:51
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entrevista
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